Poetas e poemas

Confira abaixo um pouco sobre os poetas e seus respectivos poemas que foram musicados pela banda Manzuá.

Valdelice Pinheiro

Valdelice Soares Pinheiro nasceu em Itabuna, (1929-1993). Era filha de família de desbravadores. Licenciou-se em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Foi diretora da Faculdade de Filosofia de Itabuna (antiga FAFI) e lecionou Estética e Ontologia na UESC - Universidade Estadual Santa Cruz. Como poetisa, publicou dois livros: "De Dentro de Mim" e "Pacto". Mas possui uma significativa obra inédita, poética e filosófica, prevista para futura publicação póstuma pela UESC.

Sua poesia de traço intimista, filosófico e humanista mostra uma sensível preocupação com a natureza humana e as causas universalistas, tocada, principalmente, para a transformação dos valores, para a fraternidade e para uma visão reflexiva do mundo contemporâneo. Sensibilismo agudo expressado em conformidade com um lirismo leve e harmonioso, a poesia de Valdelice Pinheiro é dotada de questionamentos e indagações que fazem do seu processo criador um conjunto equilibrado entre poesia e ação, verso e matéria cotidiana, atestando, assim, o cunho filosófico que se molda na visão crítica do mundo e num sensível espírito que toma a poesia como causa maior que gesta o verso em cada respiração.


Fonte: http://www.itabuna-ba.com.br/valdelice.htm

Rio Cachoeira 

Rio torto,
Rio magro,
Rio triste.
Parece que chora,
Sente dor...
Parece que fala em lamentos
Dos
afogados que engoliu,

Das flores que já levou.
O remorso, Cachoeira,
O remorso te entortou. 
 

Daniela Galdino

Daniela Galdino é natural de Itabuna – BA. Graduada em Letras pela Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC), Mestre em Literatura e Diversidade Cultural pela Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), Doutoranda em Estudos Étnicos e Africanos pela Universidade Federal da Bahia (UFBA)/Centro de Estudos Afro-Orientais (CEAO). Atualmente está vinculada, como Professora de Literatura, à Universidade do Estado da Bahia (UNEB). Mantém o blog www.operariadasruinas.blogspot.com e é idealizadora do Sarau “Baú dos (im)pertinentes”. No momento está finalizando o seu segundo livro de poemas, intitulado “Inúmera” e previsto para ser lançado em novembro de 2011, pela editora Via Litterarum. Em 2009 e 2010, respectivamente, participou da 1ª e 2ª edições da antologia “Diálogos: panorama da nova poesia grapiúna” (Editus/Via Litterarum). Participou das duas edições do Projeto Rock e Poesia, em 2009 (com a banda Rebocados eu acredito) e 2010 (com a banda Dr. Imbira), na Casa dos Artistas de Ilhéus. Em 2004 publicou “Vinte poemas CaleiDORcópicos” (Via Litterarum). Organizou os livros: “Tessitura Azeviche: diálogos entre as literaturas africanas de língua portuguesa e a literatura afro-brasileira” (Editus), que contou com o financiamento do Programa Uniafro (MEC); e “Levando a raça a sério: ação afirmativa e universidade” (DP&A), que contou com o financiamento da Fundação Ford. Durante a segunda metade da década de 90 fez parte do grupo que organizou, na Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC), os Saraus do Centro de Estudos Portugueses Helio Simões (CEPHS).

Conselho Infantil
Medi o Rio que divide a cidade do mim
Mirei o espectro de peixes isolados
Aspirei o miasma de sonhos esquecidos
Segui o transitar das baronesas inférteis
Multipliquei-me em silêncio
Ensaiei a elegância das garças
As tuas palavras despertaram-me
“Eu sou maior por dentro”.


Firmino Rocha
Natural de Itabuna (1910-1971). Influenciou muitos poetas de gerações posteriores. Possui um estilo lírico, místico e cheio de simplicidade e musicalidade. Sua obra não reflete complexidade acadêmica; seus versos, próximos a prosa, constituem linguagem acessível, rimas simples, trazidas de um universo emotivo que se manifesta com espontaneidade e expressivo lirismo. Escreveu "O Canto do Dia Novo" e "Momentos". Além disso, publicou poemas com freqüência regular na Imprensa local.

Seu poema mais conhecido pelos itabunenses, "Deram um Fuzil ao Menino", é um terno apelo contra a violência da guerra (alude-se à II Guerra Mundial) e, encontra-se hoje gravado em placa de bronze, na sede da ONU (Organização das Nações Unidas). Este mesmo poema foi publicado numa coletânea sobre a paz editada pela ONU e distribuída em todo mundo. Firmino Rocha, era boêmio e sonhador. Fazia da sua poesia de versos simples a expressão terna e telúrica de sua gente e da sua terra natal.

Na Manhã Passava o Rio 

Na manhã passava o rio,
Névoa e ouro vestindo,
Ia contente e risonho
Belo, puro com o sonho
De você se desvestindo.
Levava música nas águas,
Nas baronesas floridas
O adeus para as boninas. 



Ruy Póvoas           
Ruy do Carmo Póvoas (1943) nasceu em Ilhéus. Desde os tempos de escola primária que gosta de escrever. Seu primeiro livro de verso, lançado em 1985, é “Vocabulário da Paixão”, premiado em concurso. Nele, Ruy mergulha no oceano das paixões humanas. O segundo, “VersoREverso”, publicado pela Editus, volta-se para os intricados do Inconsciente e suas manifestações através de sintomas, sonhos e atos falhos. Enquanto contista, é premiado pela Academia de Letras da Bahia, com o livro “Itan dos mais velhos”. Outros contos avulsos estão à espera de editoração.
Correnteza

O rio cortando a cidade,
a cidade rompendo os homens,
os homens todos correndo,
em busca do frio chão.

O chão todo asfaltado
o transeunte assaltado,
o espírito sobressaltado:
doentes do coração.

A terra contaminada,
o rio todo cremoso,
a cidade, um calabouço,
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morada virou cadeia
e gente indiferente
com cara de lobisomem.

Tudo isso começou,
quando a cidade cresceu
esquecida da natureza
com a agonia dos homens.


Cyro de Mattos
Cyro de Mattos nasceu e reside em Itabuna, em 31 de janeiro de 1939. Contista, poeta, cronista, autor de livros infanto-juvenis. Publicou 39 livros, para adultos e para crianças. Tem livros também editados em Portugal (2), Itália (2) e Alemanha (1). No Brasil e exterior recebeu vários prêmios e, entre eles, o Afonso Arinos da Academia Brasileira de Letras, Prêmio da Associação Paulista dos Críticos de Arte, Prêmio Internacional de Poesia Maestrale Marengo d’Oro, Itália, e do Instituto Piaget de Almada, Portugal. Participou como convidado do III Encontro Internacional de Poetas da Universidade de Coimbra e  Feira Internacional do Livro em Frankfurt. 


Diante do Rio

Mancha ao invés de espuma
perau ao invés de remanso
queda ao invés de mergulho
dúvida ao invés de certeza
lua muda ao invés de ave branca
nessa tarde de brilho longínquo
maduros janeiros em tuas águas
ainda que me ocultes em tua fábula
há em tua flor de água-pé
a proposta livre da vida,
canção de aurora ribeirinha
no meu nado cristalino e afoito.


Soneto do Rio Cachoeira 
Havia céu e sol na correnteza,
Brilhinhos chuviscando a natureza.
Nos peraus e pedras negras havia
Uma lua, branca ave sem ser fria.

Não havia dúvida nem certeza
apenas rioflor, risos de pureza.
Certamente canção de noite e dia,
Certamente uma fábula que havia.

E olhos de outras águas, de lei renhida,
Rosto de sofrido sol, de sombria
Lua, decididamente haveria

De ver vidrinhos em antiga dança,
Prata da noite em superfície mansa
Reinventando os mistérios da vida.


Canção Ribeirinha

Lá vem o meu rio menino,
Água boa e leito branco,
Remanso de todas as flautas,
Verdume de todas as margens.

Lá vem o meu rio menino,
Bêbado de nuvens e visagem
Espumando zanga nas ruas,
Tremor de preces pelos ares.

Lá vai o meu rio menino,
Boi sábio em passo de cobra,
Leva vento, manhã e noite
Como companheiros de viagem.

Lá vai o meu rio menino,
No seu lombo lindas aves,
Tem no mar um velho amigo
Que o acalenta quando dorme.


Anotações Sobre o Rio 
O eterno passa
linha e curva
o sono das águas

Uma só manhã
bugre e ave
o baile das águas

O lombo escorre
o grito e a flecha
a mancha nas águas

Cantiga à margem
terra e nuvem
a dádiva nas águas

Repetido réptil
fundamento e escama
o azul nas águas

Residência última
o sonho e o mar
n a d e s á g u a

Tão ser tão pedra tão água

 
Iana Carolina
Nasceu em 1991, em Itabuna, no feriado do dia da cidade (28 de julho).
Segundo ela mesma: "no relacionamento com as outras pessoas e com o mundo, que achava ser mais ou menos estranho, demonstrava uma falta de talento notável. Era muito melhor em imaginar, olhar, fazer silêncio e em fazer nada. Até que um dia descobriu que juntando nada com olhar, silêncio e imaginação era possível produzir poesia. Hoje, portanto, uma das coisas que consegue escrever direito é poesia. Não publicou nenhuma obra, não participou de concursos, não vencendo nenhum deles, não usou gravata borboleta e não fez nenhuma dessas coisas que fazem de um poeta um poeta, realmente.  Por outro lado, escreveu muitas poesias, e isso deve valer de alguma coisa".

Poema para rio e para gente rio

Tem uma parte de mim que é perene
tão desimportante e tingida que 
dá até pra enxergar
e tem a outra parte de mim que é intermitente
que tentam despintar
mas que fica tão além da tela que 
não há pincel que chegue.
Nessa parte de mim nasce feixe e nasce peixe.

Água doce na cara ainda acorda mundo,
por isso pareço mudo, mas isso é besteira.
Do tanto que sei voar,
escorro do manzuá
transpiro gota de chuva
e rio cachoeira

(minha presença incolor
- a bem maior que esse corpo aquário -
pra entendedor que se valha
é poluição ao contrário).



Mither Amorim

Além de poeta é também integrante (bateria e percussão) da banda Manzuá.









Galope do Cachoeira
O rio que carrega o cheiro do meu povo
Nos prova que é forte pois traz sobre o peito
A mata incrustada nascendo em seu leito
Os peixes que teimam vingar contra o lodo

O rio que carrega o cheiro do meu povo
Foi chei de beré, lambarí, jundiá
E ainda permite quem queira provar
Por cima das águas o baile das garças
Ao menos com os olhos louvar a sua graça
Que corre e deságua na beira do mar.


Kléber Torres

Kléber Torres nasceu em Salvador no ano de 1947 e vive em Itabuna a mais de 50 anos. Trabalhou em diversos jornais como o A Tarde e O Globo. Atualmente é colunista do Jornal Agora. Possui um livro de poesia publicado chamado "Objeto direto.” Publica poesias e textos jornalísticos nos blogs: Reinvenção de Ulisses, http://reinvencaodeulisses.blogspot.com/ , Palavra Digital  http://palavradigital1.blogspot.com/ , Artes e manhas http://artezemanhas.blogspot.com/ 






Canto XXVIII

A tempestade não assusta o espírito do rio
que desce mar revoltado em cataratas de lama
levando esperanças, móveis e vidas
além de gente de destino incerto
roupas em desalinho
marmitas sem comida
surpresas que arrebitam os olhos
e estreitam o coração,
mas depois do caos e da imperfeita explosão
tudo volta à sua rotina
há calma e indiferença nas pedras que emergem em ilhas
e, como se nada tivesse acontecido
o vento breve veste capa de calmaria
pousa no ombro do poeta
ou assanha o cabelo do menino.


Lorenza Mucida



Lorenza Mucida Freitas é natural de Belo Horizonte- Minas Gerais. Mas já edificada baiana por morar em Itabuna- Bahia, desde 1989. Graduada em Letras pela Universidade Estadual de Santa Cruz e graduanda em filosofia pela mesma Universidade. É professora de Literatura do Ensino Médio, atua também como arte-educadora desde 2001. Já participou de diversos eventos estudantis em Universidades estaduais e federais  brasileiras como Contadora de histórias, atriz brincante e poeta. Em 2011 participou da AltFest Fliporto, em Ollinda (PE), como poetisa, assim como na Cátedra da Unesco de Leitura PUC- Rio exibiu performances no Encontro de Formadores do Projeto Agentes de Leitura, no Rio de Janeiro(RJ). Possui um blog em que registra e divulga as suas poesias; pedraemflor.blogspot.com


Boca de rio

Estas
Flores na boca
Parecem
Cortes leves
Ausentes de ave
Parecem letras breves
Ausentes de tinta
Parecem
Flores limpas
Ausentes de boca

E as águas da boca
Parecem
Rios limpos ausentes
De mágoas
Parecem
Breves passagens
Ausentes de rios
Parecem
Boca de rio, ausentes de lodo.